sábado, 29 de maio de 2010

Roma: discurso de Dom Manoel Pestana Filho, bispo emérito de Anápolis, em conferência sobre Fátima.

Apresentamos nossa transcrição do discurso proferido por Sua Excelência Reverendíssima Dom Manoel Pestana Filho, bispo emérito de Anápolis (Goiás), no “The Fatima Challenge Conference”, em Roma, no último dia 7. De antemão agradecemos as possíveis correções feitas ao nosso trabalho.

* * *

Excelências, irmãos padres, religiosos e religiosas,

Não esperem muito de mim, pois sou baixinho, mas, em suma, devo falar alguma coisa e me pediram que, ao menos, eu me comunicasse com vocês.

Roma, 7 de maio de 2010. Dom Manoel Pestana Filho discursa em conferência sobre Fátima e apresenta o livro de Monsenhor Gherardini - Concilio Vaticano II, un discorso da fare.

Roma, 7 de maio de 2010. Dom Manoel Pestana Filho discursa em conferência sobre Fátima e apresenta o livro de Monsenhor Gherardini - Concilio Vaticano II, un discorso da fare.

Algo que me parece sempre incerto é a questão do Concílio Vaticano II. Na última sessão, da qual participei, uma comissão foi até a Irmã Lucia, em Coimbra, e eu lhe encaminhei uma pergunta por escrito. Minha pergunta foi a seguinte: o terceiro segredo de Fátima tem alguma relação com o Concílio Vaticano II? A Irmã Lucia respondeu — não a mim, mas a um padre que fora com a comissão — “não estou autorizada a responder esta pergunta”. Isso é muito interessante. [...] é um sinal de alguma reserva no terceiro segredo e esta reserva tinha alguma relação com o Concílio Vaticano II.

Mas, como reversas com o Concílio Vaticano II? Estudei aqui em Roma, estudei Teologia, e isso me impressionava muito. Eu também tinha lido dois livros sobre Fátima, um do padre Marc, e um outro de um padre português, que tinha sido diretor espiritual num seminário brasileiro. E uma coisa interessante para mim era entender esta razão. E nesse meio tempo, soube que o Santo Padre Pio XI desejava reabrir o Concílio do Vaticano. O Cardeal Billot o advertiu: “Santidade, me parece que isso é um perigo, porque estamos no tempo dos modernistas e esses modernistas criaram muita confusão na Igreja. Se o concílio for aberto agora, todos estarão em condição de participar, porque muitos também eram hierarcas da Igreja e creio que isso seria uma magnífica confusão entre os teólogos, sacerdotes, religiosos e até o povo, porque todas estas questões que já haviam sido esclarecidas e algumas condenadas pela Igreja desde Pio X e também um pouco por Bento XV, estas questões estariam livres para discussão e creio que não seria bom para a comunicação e para a opinião católica”. Soube que o Papa levou em consideração o que havia dito o Cardeal Billot – o Cardeal Billot foi retirado do cardinalato alguns anos depois, mas esta é outra questão – mas o Papa teria dito sim, [o Cardeal] tem razão.

Soube também que Pio XII teve uma idéia [sobre um concílio] – estudei quatro anos em Roma quando ele era Pontífice – mas estas razões [mesmas] lhe fizeram pensar e naqueles anos ele havia escrito uma carta encíclica Humani Generis, onde ele condena aberta e duramente todas as posições modernistas, citando, inclusive, muitos teólogos de seu tempo. Eu depois fiz [...] um trabalho [...] sobre esta encíclica e situei muitas de suas citações [de autores] que eram anônimas, mas eram citações, nesta encíclica. Por exemplo, Padre Congar, por exemplo, Padre Schillebeecxs, e outros. [...], mas o Santo Padre havia denunciado muitos teólogos que depois fariam sucesso com os seus escritos.

E por isso creio que o Papa Bento XVI, com sua prudência e sabedoria, não tenha citado nas obras do Papa Pio XII esta encíclica. É interessante, pois me perguntaram uma vez: por que o Papa não cita a Humani Generis? Pensei, pensei, e disse: creio que se o Papa tivesse citado esta encíclica ele criaria um ambiente de oposição a Pio XII por parte de teólogos famosos que continuam tendo muita influência nas questões da Igreja e haviam sido grandes homens famosos, aplaudidos, no Concílio Vaticano II. Para mim foi uma decisão de muita prudência e sabedoria [...]. Depois, quando a questão da canonização tivesse avançado, eles tomariam certamente outra posição.

Mas retornemos. Seria possível que Nossa Senhora tivesse dito que não era de seu gosto, que não lhe agradava uma realização do Concílio? Eu não sei, mas se pode pensar. Com isso eu não quero dizer que o Concílio Vaticano não seja legítimo… e não seja também uma benção para a Igreja.

Não sei se vocês conhecem este livro de Brunero Gherardini, Concilio Vaticano II – Un discorso da fare – publicado pelos Franciscanos da Imaculada, aquela congregação fundada pelo padre Manelli, que é interessantíssimo… terrível este livro… mas mantém uma posição muito justa, muito bem fundamentada. Ele diz que no Concílio foram ditas muitas coisas que não são boas. Um comentarista francês dizia que era necessário distinguir aquilo que foi dito no Concílio, e foram ditas tantas coisas tolas, por exemplo, quando se discutia – e com todo respeito – a maternidade divina de Maria e também Maria mãe da Igreja; um bispo mexicano, Méndez Arceo, provocou risos, muitos risos, quando disse: “isso não me agrada, pois, se Maria é mãe da Igreja, e se a Igreja é nossa mãe, Maria não será nossa mãe, mas nossa avó”. Uma piada fora de lugar, mas, em suma, tudo era possível, e era uma Excelência que falava. E outras coisas que foram ditas; evidentemente, num ambiente de discussão, pode-se dizer tanta coisa tola [...] o delito que o homem usa e abusa de dizer o que pensa. Portanto, é necessário compreendê-lo.

Mas é ainda mais interessante que muitos daqueles que foram condenados por Pio XII – De Lubac, De Le Blond, Danielou, Congar, etc – eram homens do dia, atuais, durante o Concílio.

Mas, verdadeiramente, eu soube de uma coisa interessante: um professor da Universidade Gregoriana, que fora responsável pela comissão para os textos preliminares para o Concílio – Padre Tromp – um teólogo magnífico… Falei com ele um pouco antes de sua morte. Ele era meu professor na Gregoriana e eu até fiz um curso especial com ele. E eu perguntei como ele avaliava esta situação e ele me respondeu o seguinte: o Concílio foi um concílio bastante difícil, muito difícil, tanta energia desperdiçada, mas, em suma, uma coisa que se deve dizer é que o Concílio Vaticano II, com todas estas discussões, declarações, documentos, etc, etc, é também a indicação dada por João XXIII de ser um concílio pastoral. Até hoje não se compreende bem este sentido, sentido bem profundo de concílio pastoral. Mas sabemos que não era um concílio de definições, que terminava assim: “todos que disserem o contrário sejam anátemas, etc, etc,” como era praxe. Mas era um concílio que tratava questões católicas, religiosas e mesmo questões não religiosas, mas não concluía mais como os outros concílios, com condenações, excomunhões. Não era um concílio dogmático.

Este sacerdote, que fora nomeado chefe da comissão de redação dos textos preliminares por João XXIII, me disse: “É incrível que um Concílio assim, complexo, heterogêneo, no final das contas tenha contribuído para um dos documentos mais seguros, fundamentais da Igreja. Sim, e ele aludia ao Capítulo 8º da Lumen Gentium. Para o Padre Tromp, este documento seria um dos maiores documentos de toda a história da Igreja.

Bem, nesse Concílio havia um homem que eu admirava muito, muitíssimo, tinha lido várias vezes um de seus livros: “Teologia do Apostolado”, Cardeal Suenens e que, em suma, me fez sofrer[...]. Ele tomou a posição de comando, um comando externo, dos bispos da Alemanha e Holanda. Mas, em suma, ele era um mariólogo, um devoto de Maria e certamente ele é quem inspirou e acompanhou a redação do capitulo 8º. Bem, por que digo isso? Porque quando Suenens disse: “Santidade, não somos crianças [...]”. Recebemos uma carta, para logo ler e assinar. Nós somos bispos, nós somos sucessores dos apóstolos. Sabemos o que fazemos. [... ]. Temos que ler os esquemas e depois vamos discuti-los.

E João XXIII, vocês sabem disso, se amedrontou e disse: “sim sim, faremos um Concílio pastoral” Não há Constituições Dogmáticas num Concílio Pastoral. Faremos um Concílio para discutir as questões do momento, e não as questões de sempre, e dar a resposta convencida pela prudência e sabedoria evangélica.

O estudo feito por Gherardini considera todas essas questões e diz claramente: o Concílio é uma grande graça para o mundo, e também é este concílio, tantas coisas são ditas, mas não há nenhum peso dogmático. [..] Há coisas que podemos chamar de incertas… até alguns teólogos depois do Concílio Vaticano II disseram que a linguagem da teologia de hoje é uma linguagem de incertezas, não há nenhuma certeza em suas declarações.

Assim, me parece que isso explica que tantas coisas tenham chegado a nós com muito pouco fruto. Pelo contrário. Vejamos. Dentro do Concílio Vaticano II, não nas reuniões, foram feitos acordos com os representantes da Rússia para que não se falasse do comunismo, não se falasse de Rússia. Mas isso é o contrário da mensagem de Fátima. O centro da mensagem [...] era a Rússia, da qual virão grandes males para a Igreja e para o mundo. Mas fizeram um acordo. Ah sim! Porque havia bispos ortodoxos [para participar do Concílio]. E nós sabemos hoje que muitos bispos não só na Rússia, mas na Polônia e outros lugares, para não terem obstáculos da parte do governo comunista, faziam vistas grossas a certas coisas. Por exemplo: nós sabemos que este escândalo ocorreu na Polônia de um arcebispo que fora nomeado e que no momento de tomar posse da diocese ele simplesmente disse: “não, não posso tomar posse, porque encontraram um documento assinado por mim que me permitia sair da Polônia para estudar em Roma com a condição de colaborar com o governo sobre as coisas da Igreja que lhe interessavam.”. Este é o problema. [...] O arcebispo de Kiev, que era um homem que se aproximou muito de João Paulo I, na última audiência, morreu lá diante do Papa. Ele não era ninguém menos que um chefe da KGB e era arcebispo de Kiev. Coronel da KGB. [...] É um trabalho de muito tempo de infiltração na Igreja Católica, e se pode dizer que também o fato de Judas fazer parte do colégio apostólico, não disse nada contra Cristo, e no último momento quis lhe trair: “amigo, a que viestes?”. [...] Há momentos extremos de traição e por isso o Senhor tem muitos e muitos caminhos. [...]

Por outro lado, por exemplo, nós sabemos da influência da maçonaria no último Concílio não foi pouca, porque o próprio Monsenhor encarregado da liturgia – Bugnini – tinha escrito uma carta ao chefe da maçonaria italiana, dizendo que pela liturgia havia feito tudo que era possível; tudo aquilo, segundo recebeu instruções, mais não poderia ser feito. [...] Um padre polonês que encontrou este ofício o levou imediatamente a Paulo VI, que o mandou para fora de Roma, na nunciatura no Irã. Até Monsenhor Benelli, que era o braço direito do Papa, também foi retirado de Roma e estranhamente ambos morreram pouco depois em circunstâncias misteriosas. Dizíamos que era uma queima de arquivo. Entendem, não?

Quero dizer que mesmo os inimigos estando presente dentro da Igreja, isso não deve nos atemorizar, pois o próprio Cristo já contou aquela parábola [...] do trigo e do joio juntos e o Senhor disse “deixai crescer”, depois, na hora da colheita se separará os dois. Pois os maus, como diz Santo Agostinho, ou existem para se converter ou para nos santificar. E isso é verdade. [...] O Senhor, no antigo testamento, deixava os povos bárbaros e desumanos presentes e próximos do povo eleito para garantir a sua fidelidade e seu espírito de sacrifício. E por isso não devemos de maneira alguma pensar que estes problemas possam abalar a nossa fé. Absolutamente!

Uma vez, quando disse um pouco dessas coisas num encontro de bispos, um deles se levantou e me disse: “Você não crê no Espírito Santo?”. Eu disse: “Creio sim, e por isso estou aqui, porque creio no Espírito Santo e sei que as portas do inferno não prevalecerão”. “Eu estarei convosco até o fim do mundo”, tenhamos esta certeza absoluta, não podemos duvidar daquilo que Cristo disse. Isso seria um suicídio religioso. Se não creio em Cristo, em que acreditaria? Em meu pai, em minha mãe, em meu amigo, no Papa? Se não creio em Cristo… e por isso estou seguro, seguro com armas, com sofrimentos, com sangue, sim, sim, é verdade. Quando penso, por exemplo, no Pe. Gruner, vejo nele um mártir da Igreja moderna, sem dúvida. Não se pode compreender a sua vida sem a palavra de Deus que diz: “o reino dos céus é sofre violência, e são os violentos que o alcançam”.

Creio que poderia dizer – digo como uma palavra minha — e suspeitar que o Concílio Vaticano II está relacionado [...] com o terceiro segredo de Fátima. Alguns de vocês me dirão: “mas isso não é atual”. Mas é atual sim, pois se nós publicamos isso, teremos que enfrentar o temor de nossos fiéis que dirão: “O que? Vocês não acreditaram?”… Porque me dirão que eu fui fraco, que eu fui estúpido… essas não são justificativas para que eu possa dizer: “não sou responsável” ou “não estava nessas coisas”.

[...] victoria quae vincit mundum: fides nostra. A nossa fé é a vitória que vence o mundo. Que vence o mundo! Eu estarei convosco até a consumação dos séculos. As portas do inferno com ela. Nem a maçonaria que é o corpo místico de Satanás, nem as heresias são realmente a lepra da nossa Igreja, mas que encontram sempre na graça de Maria e no amor de Cristo um remédio salutar para todos os males, nada disso me deve fazer perder a coragem ou deixar de lutar.

Um dia eu falava na conferência dos bispos do Brasil contra o aborto, porque eu trabalho muito – poderia e deveria ter trabalhado ainda mais. E um bispo me disse: “Mas Dom Pestana, o senhor tem que entender que não podemos perder tempo [...] com uma batalha perdida. O aborto vem! Como veio para quase todas as nações. Não se pode perder tempo com essas coisas”. E eu disse: “Excelência, Deus não te julga se ganhamos ou não a batalha, mas se lutamos e se lutamos bem”. E assim penso que vocês estão fazendo, e por isso estou aqui com a alma renovada, encorajado [...] mesmo com o meu joelho com duas placas de metal.

Deve-se pensar nisso: eu devo lutar. [...]. Sempre recordo de uma estória, e gosto de contar estorinhas [...] para ensinar o catecismo. Um elefante corria na África e, de repente, uma formiga na sua orelha lhe diz: “Elefante, olhe para trás, veja quanta poeira estamos fazendo”. Nós estamos fazendo. E pensamos que somos nós que estamos fazendo. E por isso o personalismo no apostolado é um grande perigo. É Deus quem faz, e só quando os homens se convencerem que Deus faz aquilo que nós fazemos é que acreditarão em nós. Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, Amém.

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Fonte: The Fatima Challenge

Visto em: Fratres in Unum

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