sábado, 2 de janeiro de 2010

Silêncio perdido, oração...

Nasci em São Sebastião do Paraíso-MG uma cidade pacata, com cerca de 60.000 habitantes, movida ainda pela safra do café e um comércio em crescimento. A igreja central, a Matriz de São Sebastião, é em estilo românico (prefiro o gótico) e, embora o altar-mor esteja deslocado da parede, o Santíssimo ainda permanece em seu centro. Dois altares laterais conservam as imagens do Sagrado Coração e da Virgem Maria que se harmonizam com paredes e colunas em sóbrios tons e bela pinturas no teto. Mas algo que me encanta na Igreja é seu belo quebra-vento, em madeira e vitrais, ele traz a figura de dois anjos em cujas auréolas estão os dizeres: Silêncio e Oração.

Silêncio e Oração, eis coisas que faltam em nossas igrejas atualmente.

Embora resida em Franca-SP, meus parentes ainda estão em Minas e às vezes tenho que visitar algumas cidades mineiras para os mais diversos fins. Há pouco estive em Capetinga-MG (Diocese de Guaxupé) onde entrei na Igreja de São José, uma daquelas capelas antigas que sofrera a cirurgia dos ventos modernistas. Em seu solo ainda se nota o Alpha e Ômega, em suas paredes destaca-se dizeres latinos datados da consagração da igreja anterior ao Concílio. No presbitério a decepção, constratando com um magnífico crucifixo vê-se uma mesa sob um piso frio e grandes cadeiras onde antes deveria fica o altar. O santíssimo deslocado para o lado esquerdo era adorado com silêncio e oração pelas senhoras e senhores de cabelos brancos com as fitas vermelhas do Sagrado Coração. O Rosário de Maria era recitado e no momento que me aproximei, devo ter causado estranheza, algumas cabeças brancas se voltaram para este “jovem” que fez a genuflexão e rezou um pouco. Ao sair me surpreendi pensando que, apesar de certos padres e bispos, há leigos que ainda mantém a devoção requerida, só me preocupei com a falta de jovens naquele lugar, deveriam estar preparando suas guitarras e baterias para “Missa” do fim de semana, ou em algum encontro tentando “falar em língua” ou ser “batizado no espírito”, ou pior em algum bar aprendendo outras coisas. Onde estão os pastores? As ovelhas estão desgarradas. Pelo menos ali eu encontrei silêncio e oração.

Bem, de volta à Minas, em Guaxupé, sede diocesana, desejei um pouco de silêncio para rezar a Laudes e o terço, por isso fui à Catedral, que graças ao bom Deus estava aberta e não fechada como o restante das igrejas da cidade. Lá chegando aquele sentimento de desgosto tomou conta de mim, uma igreja gigantesca, mas fria e com problemas de acústica. A Cátedra do bispo deslocada ao lado esquerdo sem o seu antigo sustentáculo com seus degraus e cobertura, como um pequeno balquino, agora jogado sabe Deus onde, talvez na cripta trancada onde jaz os corpos dos bispos do passado, um deles com fama de santidade, Dom Inácio.

Um presbitério alto que ainda conserva a mesa de comunhão e um crucifixo que faz menção à serpente do deserto se fazia vazio sem o Santíssimo, Este se encontra agora ao lado esquerdo sob um pedestal de pedra que se opõe ao outro lado do braço da cruz que forma a Catedral, lá uma imagem de Nossa Senhora das Dores sobre concreto e armações modernistas, ao seu lado um pequeno presépio que trazia um pentagrama invertido como estrela de Belém (não resisti e coloquei a ponta da estrela para cima).

Nesse cenário de gigantescas colunas e paredes sem pintura alguma (a única que existia era o do batismo de Cristo e fora apagada há anos) lembrei da Igreja de São Sebastião em minha cidade natal, a Catedral traz em si o estilo românico, bastaria pintá-la, a arte pode ser também um veículo para a oração e a intimidade com Deus, uma obra catequética de fato.

Enfim, em meio a tudo isso rezei as Laudes em frente o Santíssimo e caminhei pela templo enquanto recitava o terço... foi difícil, a mente sendo levada pela triste realidade de um púlpito jogado atrás de um confessionário desgastado pela falta de uso e pelas constantes conversas ao meu redor que dificultaram em muito uma meditação adequada.

Ao retornar à frente do Santíssimo para concluir o terço e minhas últimas preces, ainda me entristecia as cenas da via sacra colocadas ao longo do prédio santo, seus traços quase fora de foco me faziam duvidar de seu bom gosto. E aí o silêncio fez falta mais uma vez, não bastasse turistas com suas máquinas fotográficas e conversas que ecoavam pela Catedral, o zelador da mesma com sua vassoura que haviam feito um ótimo trabalho, a igreja estava mesmo limpa, parou bem à entrada do recinto onde colocaram o Santíssimo para conversar e conversar com uma senhora sobre a ação de outra pessoa... o Salve Regina custou a sair e saindo saiu eu pedindo perdão a Deus por não ter conseguido rezar como deveria... Pensei então em ir ao cemitério, lá estaria o silêncio e quem sabe mais uma oração pelos fiéis defuntos, mas era dia de feira e não pude entrar no mesmo já que as ruas e a praça estavam tomadas pelo comércio...

Silencio e Oração diziam os anjos, e os homens o que dizem?

Silêncio perdido, oração...

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