Já havia
mencionado aqui e aqui o caráter populista do
pontificado de Francisco, uma espécie de "Francisquialismo". Parece
que eu não fui o único a perceber semelhanças entre a atuação do papa Francisco
e os típicos regimes latino-americanos do período de urbanização e
industrialização da América Latina. Os bispos, reunidos em sínodo,
deixaram uma clara mensagem, ao que tudo indica, direcionada ao papa: criticam
o que um grupo de discussão chamou de “busca por um populismo complacente
que silencia e amordaça”.
Nem mesmo
a mediada de nomear o Cardeal Napier para a Comissão para elaboração do
Relatório Final do Sínodo parece ter acalmado os bispos. Tem ficado cada
vez mais claro que vozes se erguerão contra o autoritarismo papal. Os bilhetinhos do mesmo, talvez expressem justamente
isso. Teria ele percebido que mesmo na iminência de serem punidos, muitos irão
fazer oposição à ruína da doutrina?
O Frates in Unum nos dá os detalhes:
Relatórios
dos grupos de discussão do Sínodo querem mais contexto doutrinal e linguagem
“profética” no documento final.
Por John
Thavis, 16 de outubro de 2014| Tradução: Fabiano Rollim – Fratres in Unum.com:
Relatórios dos 10 grupos de discussão do Sínodo dos Bispos estão surgindo [ndt:
foram publicadas ontem], e muitos deles se opõem seriamente a um relatório preliminar
– a relatio post
disceptationem – que há
apenas três dias parecia inaugurar um novo capítulo na tentativa de aproximar a
Igreja de casais que coabitam sem ter o sacramento do matrimônio, de casais de
pessoas divorciadas e de “casais” gays.
Esses
relatórios, vistos como um todo, representam um verdadeiro teste para o
Evangelho da “misericórdia” pregado pelo Papa Francisco, porque não apenas
articulam o desejo por uma qualificação doutrinal no documento do sínodo, mas
também criticam o que um grupo de discussão chamou de “busca por um
populismo complacente que silencia e amordaça” o que a Igreja ensina sobre
o casamento e a família. Mais de uma pessoa observou que o termo “populismo
complacente” talvez seja direcionado em parte ao próprio Papa Francisco.
Os
relatórios foram apresentados à assembleia do Sínodo após quatro dias de
discussão, juntamente com várias centenas de propostas de correções para a relatio preliminar. É certo que tais
relatórios refletem um processo estabelecido para melhorar a relatio, de forma que era
esperado que se encontrassem pedidos de esclarecimentos, muitos dos quais
parecendo ser apoiados pela maioria, e não endossos acalorados do texto.
Alguns
dos relatórios, em certos pontos, até fazem eco a algo da linguagem da relatio — por exemplo no uso de uma nova
linguagem e de um tom mais convidativo. Mas a oposição não é pequena. Vários
grupos, por exemplo, propuseram que seja reescrita a segunda seção da relatio,
aquela que chamou a atenção de todos com o seu argumento de que a Igreja deve,
por exemplo, aceitar a realidade do casamento civil e da coabitação e focar nos
valores positivos que podem ser encontrados nessas uniões. Mais especificamente
sobre a “lei da gradualidade” — o princípio de que a Igreja deve se aproximar
daqueles que não aceitam plenamente seus ensinamentos, valorizar essas pessoas
e acompanhá-las — dois grupos disseram que o conceito não pode ser aplicado a
essas situações. Vários outros grupos questionaram sua aplicação. Outros
questionaram a tentativa que é feita na relatio de aproveitar o princípio
enunciado pelo Vaticano II da busca por “elementos positivos” fora das
estruturas da Igreja e aplicá-lo para o caso de uniões irregulares fora do
sacramento do matrimônio.
Quase
todos os grupos expressaram o desejo de que o documento final do sínodo
apresente uma imagem mais positiva do sacramento do matrimônio, expresse
explicitamente os ensinamentos da Igreja e redescubra a voz “profética” da
Igreja em criticar as ameaças modernas à família tradicional.
Um grupo
disse que seus membros estavam divididos sobre a questão da linguagem. Alguns
consideraram “indispensável” que o sínodo expresse seus ensinamentos sobre o
casamento, a família e a sexualidade “sem hesitar em empregar as categorias de
‘pecado’, ‘adultério’ e ‘conversão’ no que diz respeito a situações que
objetivamente contrastam com o Evangelho.” Outros recomendaram uma linguagem
mais encorajadora e menos julgadora como uma chave para a evangelização nos
dias de hoje.
Em
relação à questão da readmissão de católicos divorciados e recasados à
Comunhão, houve opiniões misturadas nos relatórios, com alguns endossando a
possibilidade, alguns a rejeitando e outros pedindo um estudo mais aprofundado.
Pouco foi dito nesses relatórios sobre a simplificação do processo de
declaração de nulidade matrimonial, uma ideia que aparentemente tinha um forte
apoio do sínodo, apesar de um grupo ter feito uma objeção à ideia de um
processo de nulificação “administrativo” conduzido por bispos locais.
Os
relatórios opuseram-se ao que chamaram de uma ênfase exagerada nos elementos
positivos que se encontram fora do casamento. Um grupo de língua inglesa disse
que “onde a relatio parecia estar sugerindo que o sexo
fora do casamento ou a coabitação poderiam ser permitidos, tentamos mostrar por
que tais estilos de vida não levam à realização humana.” Quanto às “sementes de
verdade e bondade” que a relatio disse que podem ser encontradas em
uniões irregulares, este grupo disse que o sínodo deve enfatizar que tais
“sementes” são encontradas nas pessoas envolvidas, não em seus relacionamentos.
“Acreditamos que se deixarmos implícito que certos estilos de vida são
aceitáveis, certos pais zelosos e preocupados poderiam facilmente dizer: ‘Por
que temos tentado tão arduamente encorajar nossos filhos e filhas a viver o
Evangelho e a abraçar o ensinamento da Igreja?’”, disse o relatório.
Mais de
um grupo disse que houve um risco de mal-entendido na seção do documento
preliminar que trata sobre a “acolhida de pessoas homossexuais.” Um grupo de
língua francesa disse que ao mesmo tempo em que a discriminação contra pessoas
homossexuais deve ser denunciada, “isso não significa que a Igreja deva
legitimar as práticas homossexuais e muito menos reconhecer o chamado
‘casamento’ homossexual.” Um segundo grupo francês tocou num ponto similar
dizendo que “acompanhar pastoralmente uma pessoa não significa validar nem uma
forma de sexualidade nem um estilo de vida.” Um grupo de língua espanhola disse
que o termo “pessoas homossexuais” parecia usar a sexualidade como a chave da
identidade dessas pessoas, e que seria mais exato falar em “pessoas com
tendências homossexuais.”
Um
relatório em língua inglesa disse que a Igreja tem de acolher “sem julgamento
ou condenação” aqueles que vivem em uniões irregulares, mas de forma que não
enfraqueça o matrimônio sacramental ou “deixe a impressão de que todas as
uniões são iguais.” Outro grupo falou do acolhimento a tais pessoas, mas também
de levá-las à “conversão” e ao sacramento do matrimônio.