sábado, 20 de setembro de 2014

O Ocidente contra si mesmo.


Bento XVI, aos 22 de setembro de 2011, proferiu um discurso no Palácio Reichstag de Berlim, concluindo o mesmo com a seguinte ideia:

A cultura da Europa nasceu do encontro entre Jerusalém, Atenas e Roma, do encontro entre a fé no Deus de Israel, a razão filosófica dos Gregos e o pensamento jurídico de Roma. Este tríplice encontro forma a identidade íntima da Europa. Na consciência da responsabilidade do homem diante de Deus e no reconhecimento da dignidade inviolável do homem, de cada homem, este encontro fixou critérios do direito, cuja defesa é nossa tarefa neste momento histórico...”. (Bento XVI, 22 set 2011)

Bem, o que Bento XVI fala da origem da cultura europeia pode-se dizer de todo o Ocidente. Os fatos históricos são inegáveis, a cultura europeia veio para a América e outras áreas ao longo dos processos coloniais. Mesmo aqueles valores iluministas, maçônicos, possuem raízes na laicização do pensamento cristão, ou na deturpação da “fraternidade, igualdade e liberdade”. A estirpe desta ‘sagrada trindade maçônica’, está na deformação antropocêntrica dos ideais teocêntricos cristãos.

A ‘fraternidade cristã’ está ligada à perspectiva da adoção amorosa de Deus para com a criatura humana; da mesma forma, a ‘igualdade’, só é real diante do Pai que nos adota, todos iguais em dignidade, mas não em talentos, virtudes etc. A ‘liberdade’ também tem sua explicação no ato criador e amoroso de Deus, fazendo-nos livres para escolher.

A modernidade e seu antropocentrismo culminaram, do Renascimento ao Iluminismo, na laicização e na adulteração do pensamento teocêntrico cristão. Com isso, a fraternidade ganhou novo sentido com os filhos que mataram o pai da nação (o rei Luís XVI) na Revolução Francesa, um irmão que precisa cuidar do outro, o sentido maçônico de ajuda mútua foi ganhando força nas concepções deístas que entendiam o “.’. Grande .’. Arquiteto .’. Do .’. Universo .’.” como um ser ausente, uma deidade que abandonara sua criação.

De forma semelhante, a concepção de ‘igualdade’ ganhou aspectos políticos e materialistas. Os filhos da Revolução, o Iluminismo e o Socialismo, passaram a pregar a igualdade, claro, dentro suas próprias interpretações. Por um lado, o liberalismo apregoou uma igualdade de direitos para que, diante da não-interferência do Estado, por um suposto mérito pessoal, as pessoas egoisticamente pudessem buscar a riqueza e com isso uma ‘mão invisível’ conduziria a todos para um mundo melhor. No oposto, o Socialismo apregoou uma ditadura do proletariado, um Estado totalitário, para concretizar uma expropriação e uma utópica igualdade promovida por este, que ao final de seus objetivos se imolaria como um cordeiro redentor da humanidade, do Comunismo.

A ‘liberdade’, por sua vez, foi a pedra de toque do Iluminismo e até hoje ecoa, com o seu novo sentido, presente em diversas Constituições: “Todo homem é livre para ir e vir”. O problema é: quem pode ir e vir? A sociedade, também utópica, iluminista não conduziu todos com a ‘mão invisível’, de Adam Smith, ao mesmo patamar de ‘igualdade’ para que todos possam ir e vir.

Enfim, o Ocidente parece sempre negar suas raízes, laicizá-las, deturpá-las. Daquele tripé mencionado por Bento XVI, o mais atacado é Jerusalém, o Cristianismo.

Nietzsche, Sartre e Foucault são os mais lembrados, mas não apenas estes, na Contemporaneidade, são os combatentes intelectuais do Cristianismo. Liguem a televisão, leiam os jornais, o ataque é sempre contra tudo o que o Ocidente representa. Loas são feitas a qualquer coisa, a qualquer um, e os ataques se dirigem sempre àqueles que defendem as raízes cristãs.

Bento XVI foi vítima constante destes ataques, desde a época em que era chamado de “cardeal panzer” e claro, principalmente, como papa. Ainda carrego comigo a ideia de que sua renúncia, ligada ao seu desgaste físico e espiritual, está diretamente imbricada à forte oposição que teve de enfrentar. É interessante ver como o enfoque dado aos escândalos de pedofilia cessou na mídia com o “populismo de Francisco” e seu quase silêncio doutrinal.

Esta mesma mídia deveria, no mínimo, repensar o que já escreveu acerca de Bento XVI. Como, neste momento histórico de perseguição aos cristãos em alguns países islâmicos, não se recordar de mais um pronunciamento de Bento XVI?

No sétimo colóquio (διάλεξις – controvérsia) publicado pelo Prof. Khoury, o imperador aborda o tema da jihād, da guerra santa. O imperador sabia seguramente que, na sura 2, 256, lê-se: «Nenhuma coacção nas coisas de fé». Esta é provavelmente uma das suras do período inicial – segundo uma parte dos peritos – quando o próprio Maomé se encontrava ainda sem poder e ameaçado. Naturalmente, sobre a guerra santa, o imperador conhecia também as disposições que se foram desenvolvendo posteriormente e se fixaram no Alcorão. Sem se deter em pormenores como a diferença de tratamento entre os que possuem o «Livro» e os «incrédulos», ele, de modo surpreendentemente brusco – tão brusco que para nós é inaceitável –, dirige-se ao seu interlocutor simplesmente com a pergunta central sobre a relação entre religião e violência em geral, dizendo: «Mostra-me também o que trouxe de novo Maomé, e encontrarás apenas coisas más e desumanas tais como a sua norma de propagar, através da espada, a fé que pregava»”. (Bento XVI, 12 set 2006).

Os meios de comunicação social, acompanhados de teólogos midiáticos, que adoram falar em ‘cadeira de Galileu Galilei’ etc, fizeram ecoar jargões para qualificar o então papa como “retrógrado”; “destruidor do ecumenismo”, “cometedor de gafes” etc. Toda a Aula Magna apresentada na Universidade de Regensburg, aos 12 de Setembro de 2006, em seu encontro com os representantes das ciências, fora resumida em uma citação. As repercussões só cresciam com o estardalhaço jornalístico. Era como se o Ocidente culpasse a um de seus mais notórios representantes por um fiasco e legitimassem um possível atendado terrorista contra o mesmo.

Bem, e agora? As palavras de Bento XVI saíram do campo do discurso e ganharam conotação quase que de ‘profecia’. Cadê a mídia? Cobrindo uma possível ação dos EUA e seu presidente. Os EUA devem ou não intervir? Se não o fazem, serão culpados por omissão, se o fazem, serão culpados por intervirem e, claro, irão buscar qualquer ‘abuso’.

Enfim, mais uma vez, o Ocidente nega a si mesmo.