DILEXI TE:
primeiras impressões
Ao terminar
de fazer uma primeira leitura sobre a Exortação Apostólica de Leão XIV, acerca
do amor para com os pobres, faço algumas considerações:
1.
A exortação é uma herança de Francisco, um
documento a quatro mãos, ou até mais, pelo que se pode depreender de um possível
método de bricolagem.
2.
No início do documento, a começar pelo seu
título, há diversas citações bíblicas que foram retiradas de seus respectivos contextos
e se perderam em meio a tentativas de alegorias para situações hodiernas.
3.
A exortação amplia o conceito de pobreza,
incluindo questões culturais e, em diversos momentos, chama a uma análise
cristocêntrica do problema da pobreza.
4.
O miolo do documento é sua melhor parte,
riquíssimo na história bimilenar da Igreja, apresentando, em uma linha do
tempo, a ação da Igreja, com citações das Escrituras, da Patrística, dos
fundadores de ordens religiosas e suas atuações, movidos pela Caridade Cristã.
É possível notar uma comunhão dos santos ao longo dos séculos, desde a
escolha dos sete diáconos até a atuação das Congregações Religiosas fundadas no
século XIX em benefício da educação dos pobres (é triste constatar o estado em
que se encontram essas mesmas Congregações hoje em dia, grande parte sem
vocações, com colégios fechados e perdidas de seu sentido fundacional).
5.
Sua parte final é carregada de citações de
documentos emitidos por Francisco e é aqui, mais uma vez, que se tem a
impressão da bricolagem. Os documentos de Francisco eram sempre autorreferenciais.
Os trechos finais dão essa impressão.
6.
Certos problemas apresentam-se, então:
a.
Assume-se um posicionamento político-ideológico
que ecoa o populismo latino-americano de Francisco.
b.
Não se denuncia o uso da pobreza por certos
partidos e entidades que atuam na política.
c.
Não se denuncia políticos nem governos que fazem
aumentar a pobreza tornando a população mais dependente do Estado e de suas
promessas. (Há apenas uma citação de Bento XVI que tange de leve esse tema, sem
aprofundá-lo nessa exortação).
d.
Não se denuncia as religiões-políticas que
usurparam o papel do Cristianismo na Educação e na Caridade Hospitalar e, acabaram
por engendrar um culto ao Estado através de seu assistencialismo.
e.
A questão da migração é apresentada de forma
ingênua com uma tentativa de comparação indevida entre a emigração europeia do
século XIX e a imigração para a Europa nos dias atuais. Desconsidera-se que as
ordens religiosas que se dedicaram àqueles migrantes visavam manter a fé cristã
e que, hoje, não são cristãos que entram na Europa e, muito menos, há pretensão
de cristianização desses migrantes e refugiados. A ingenuidade reside em não se
atentar para o fato de que a Europa caiu no laicismo e multiculturalismo, está
em um inverno demográfico e recebe em seu seio grupos que em cinquenta anos
serão a maioria e colocarão à margem da história o que Carlos Martel e a Cristandade
conquistaram. Faltou uma análise realista do problema em pauta. Caridade e
Verdade deveriam estar juntas na ação da Igreja. Essa não deveria atuar como
mais uma, entre tantas, ONGs. Confunde-se caridade com assistencialismo.
f.
Corre-se o risco de ser instrumentalizada, não
toda, mas certos trechos, por certos partidos políticos de interesses escusos
ao Cristianismo.
g.
Ainda em seus trechos finais, nota-se muitas
citações das Conferências do Episcopado Latino-Americano: Medelin, Puebla etc.
Aqui, pode-se achar até alguns problemas teológicos, como a ideia de “Pecado
Social” (quem peca é o indivíduo, só ele pode se arrepender e confessar-se).
Para concluir,
a exortação apostólica, cujo objetivo é convidar o povo a viver o Evangelho com
novo ardor, apresenta bons pontos, principalmente, no que tange à tradição da
Igreja, à identificação do pobre na pessoa de Cristo, no impulso à caridade, na
compreensão de que a fé sem obras é morta. No entanto, apresenta análise rasa
sobre alguns problemas sérios, com forte tendência a repetir o mainstream sem
a devida análise crítica de conceitos empregados. Repito, o texto soa como uma
bricolagem, vários recortes colados tentando encontrar um sentido que muitas
vezes se perde em citações descontextualizadas e anacronismos.